Outra sexta.


A saída do metrô Vila Mariana é sempre uma corrida de obstáculos por entre vendedoras cantantes de guloseimas e distribuidores de panfletos que prometem carteiras de motorista baratas e resolução de problemas espirituais. Das vendedoras eu passo longe, estou muito gordo e não posso tocar em suas calorias excessivas. Carteira de motorista eu já possuo. O que me indigna são os panfletos de videntes, astrólogos, tarólogos e demais picaretagens. Porra, eu não tenho problema espiritual porque não tenho espírito, sou ateu e cético cacete! Se eu precisar resolver algum problema na minha cabeça pago um psicólogo, que investiu anos de sua vida estudando alguma coisa com base científica e dispõe seus conhecimentos em troca de remuneração justa para tal.

Era uma sexta. E após minha divagação filosófica a respeito dos panfletos místicos, chego em casa e resolvo que não irei sair. Prefiro alugar qualquer porcaria em DVD (sexta por volta das 20h não existe mais filme bom em nenhuma locadora do mundo ocidental) e preparar uma apetitosa pipoca de microondas para acompanhar o copo de 500ml preenchido pelo miraculoso líquido negro gaseificado que convencionamos chamar de Coca-Cola.

A pipoca de microondas não é para amadores. A maioria das pessoas acredita que basta jogar o saco lá dentro, marcar o tempo indicado na embalagem e aguardar o estouro. Quanta ingenuidade! O correto preparo da iguaria depende de uma complexa equação envolvendo as marcas da pipoca e do microondas. O tempo de preparo varia muito de acordo com estes dois fatores e o gourmet que se aventurar na seara pipoqueira deve ter isto em mente. É preciso acompanhar o saco de pipocas de perto, ficar ao lado do forno, observando, captando sinais. Às vezes as pipocas estouram, mas por meros cinco segundos a mais ou a menos, você corre o risco de obter muito milho e pouca pipoca ou uma massa enegrecida de desafortunadas pipocas carbonizadas.

Eu não sou bom com pipocas, sou ótimo, um astro. Eu elevei a produção de pipocas em fornos de microondas à categoria de arte. Ninguém no mundo faz isso melhor que eu, ninguém. E naquela sexta-feira eu já preparava o show na cozinha quando meu pouco equipado telefone celular anunciou uma chamada. Era o Flávio, amigo que adora me colocar em roubadas noturnas. Pensei em atender e dar como desculpa para ficar em casa uma diarréia imediata de terceiro grau, mas a curiosidade em torno do que poderia ser proposto me fez apertar o botão verde.

- O que é desta vez? Se eu terminar a noite novamente em uma festa de reggae conversando com mulheres que não depilam as axilas desde 1998 eu juro que te faço comer capim.

- Vamos parar de remoer o passado, hoje é outra sexta-feira, as esperanças de diversão se renovam. Guarde essa cara de bunda velha no armário e vamos pra guerra!

- Merda, qual é a idéia desta vez?

- Vila Olímpia! Esta noite seremos playboys!

- Como assim??

- Isso mesmo! Vamos ver pessoas diferentes, outros ambientes, outra música!

- Hummm...pode ser engraçado.

- Exato! Vamos nessa, escolhe uma roupa mais arrumada que em 25 minutos eu passo aí.

- Camiseta de banda não pode? E All Star?

- Esquece! Temos que nos misturar ao ambiente, arruma algo mais maurício.

Flávio possui a estratégica tática verbal de determinar 25 minutos como prazo para qualquer coisa, pois é um tempo meio-termo: ele dificulta a contagem dos minutos para seu interlocutor, pois dizer “meia hora” abre margem para um cálculo mais fácil de horário ou de uma interjeição do tipo “porra, meia hora??”. Já os 25 minutos não prometem a mesma rapidez de 10 ou 15, mas também não soam ofensivos e, caso ele consiga a proeza de chegar em menos tempo, ainda transmite imagem de pontualidade.

Enfim, uma hora e meia depois estávamos seguindo pelo complexo viário Ayrton Senna rumo ao desconhecido, ou melhor, à Vila Olímpia, o que para nós é quase a mesma coisa. Caprichamos no figurino e no jogo de cena, inclusive andando com os braços para fora da janela do carro e portando estratégicas cervejas long neck na mão para melhor configurar nossa atitude playbo-mauricística.

Antes do ponto de parada final, circulamos por algumas ruas da área, observando o movimento nos barzinhos e buscando alguma adaptação com o estranho universo dos lugares-comuns. Assim como nas regiões da cidade dominadas por gente “descolada”, “cheia de atitude”, “formadora de opinião” ou algum outro rótulo pedante, os estereótipos também são facilmente reconhecíveis na região mauricinha: pitboys, surfistas ruins de prancha, cachorronas, pagodeiros chiques, etc e muitos etc. Uma categoria que eu desconhecia eram os motoboys-hip-hop da esquina da Faria Lima com a Juscelino. Pelo que notei, os futuros integrantes do também futuro da nação, disputam pegas ou algo semelhante pelas redondezas, sempre mantendo a atitude bruto-neanderthal, combinando perfeitamente com os tempos de terrorismo e ignorância vividos pela cidade nos últimos tempos. Esta é a verdadeira vanguarda de comportamento da capital.

Chegando ao local pré-marcado para a noite continuar (o qual prefiro não citar o nome para não configurar propaganda de estabelecimento não merecedor da mesma), com muita dificuldade consegui pegar uma cerveja, já que tenho apenas 1.69m de altura e o lugar estava irritantemente lotado de caras ao menos 10 centímetros mais altos que eu disputando a atenção dos funcionários do bar. Rapidamente sequei a primeira garrafa, tentando lançar olhares oblíquos para as mulheres presentes no local, sem sucesso algum obviamente, pois nenhuma conseguiria me enxergar. Na segunda tentativa de beber, ergui meu braço o máximo que pude com o cartão de comanda em punho, na esperança do garçom conseguir enxergar minha mão atrás dos ombros de algum dos jogadores de basquete que se amontoavam na droga do balcão. Encostei o braço sem querer em um cara não tão alto, mas de largura suficiente para ocupar dois lugares no ônibus sem ser incomodado.

- Qual é, porra? Tá me tirando? – Disse o troglodita com algum sinal de sotaque nordestino.

- Er...foi mal, desculpa aí.

- Desculpa é o caralho, tu quer levar uns...

- Ei, cara, essa tatuagem na tua mão é do Leão?? – Em rápido lance, interrompo o cara antes de, no mínimo, levar um empurrão.

- É sim, Sport Club do Recife – Ele responde meio desconfiado, desta vez com sotaque mais caprichoso nas palavras “isporte” e “récife”.

- Pô, eu também torço pelo Leão, mas o Leão do norte, o Remo.

- Sério? Sempre vou na Ilha, já vi teu time perder pro meu em Recife várias vezes.

- Olha só que bacana, eu também já vi o Sport, também ganhando do Remo, mas em Belém.

- Vocês estão na lanterna agora, né?

- Pois é, essa diretoria...

- Ô rapaz, nem me fale, a do Sport também...quer que eu peça a tua cerveja? Sou mais alto.

- Ah, eu agradeço.

Após comentarmos mais algumas peculiaridades futebolísticas da segunda divisão nacional, despeço-me amistosamente do torcedor-colega de Série B e volto a observar o ambiente. Finalmente percebo que existe uma dessas bandas genéricas de pop-rock no local, executando hits óbvios para estas ocasiões. Flávio, sumido desde que entramos, surge desesperado me puxando pelo braço.

- Doda! Doda! Olha isso aqui por favor! – Pensei em algo sensacional, tipo duas mulheres em tubinhos pretos e sem calcinha no maior amasso na porta do banheiro, mas não era bem isso.

- Puta merda...

O vocalista da banda, um cara que conseguia ser mais baixo que eu e levemente mais gordo, se esgoelava cantando Satisfaction e imitava os trejeitos de Mick Jagger no palco: as tremidinhas, as caras e bocas, tudo. Por mais que a descrição possa remeter ao grotesco, o cara realmente sabia o que estava fazendo. A partir daí resolvi dar um crédito para a banda e, como nos tempos onde eu emendava da faculdade para um boteco, acabei enchendo a cara ao som dos rocklichês. A última música me surpreendeu, positivamente inclusive, pois bandas cover de jardim não costumam tocar Jailbreak do AC/DC.

A noite segue comendo fatias de minha conta bancária em forma de cervejas debitadas no cartão-comanda do estabelecimento. Devidamente encorajado pelo álcool, analiso o que falar para alguma das senhoritas de cabelo escovado que se aglomeram em todos os cantos.

- Oi.

- Oi.

É, com essa não deu certo. Ela estava passando muito depressa, talvez estivesse desesperada para ir ao banheiro fazer xixi ou conferir o estado da maquiagem.

- Oi, tudo bem?

- Tudo.

Mais uma que passa rapidamente a caminho de algum outro lugar que não o meu lado esquerdo ou direito.

Após a banda, o DJ de plantão assume o som e alterna o set list entre funk carioca e dance music estilo rádio pop FM.

Uma morena de pele clara, um pouco mais baixa e possuidora de um sorriso que me faria invadir o Iraque com uma desculpa esfarrapada qualquer puxa assunto comigo.

- Oi, tudo bem? – Ela pergunta.

- Tudo e com você?

- Legal também. Qual seu nome?

- Eduardo, e o seu? (para desconhecidos eu sempre me apresento como “Eduardo”, com “u” mesmo. A revelação de que ninguém me chama assim e que meu nome é “Edoardo” com “o” consome tempo demais e pode ser explicada depois)

- Carla.

- É, você tem a maior cara de Carla mesmo, saca? Eu ia até arriscar um palpite, vi você ainda agora dançando ali na frente e pensei “aquela é a Carla” e...

- Você tem um cigarro?

- Tenho sim, ó...quer fogo?

- Ah, obrigada, mas não precisa, meu namorado tem.

Deu o tradicional beijinho único de paulista em meu rosto e sumiu, deixando minhas piadas pelo chão e a garrafa long neck em minha mão.
- Flávio, eu vou embora.

- Mas já?

- Já, antes que a gente termine a noite em uma festa de reggae conversando com mulheres que não depilam as axilas desde 1998.

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Paulistanas - Madalena


O pé sofre apertado na sandalinha de couro comprada na Benedito. Pode ter sido adquirida em shopping por valor mais elevado, o importante é que tenha aparência barata, ou uma falsa aparência popular, desde que as outras saibam muito bem o quanto custa na Arezzo mais próxima.

Ainda o pé, apóia-se em uma das barras de madeira da mesa do boteco paulistano de pretensa alma carioca. Ele, o mesmo pé, exibe um desenho floral, tribal, oriental ou alguma coisa de sufixo semelhante. Traços escuros sobre pele branca, avermelhada de janeiro a março.

A saia parece ter vindo de algum ano mais setentoso. É longa ao sul, chega até o tornozelo, mas ao norte é quase um palmo abaixo do umbigo. Na mesma região, porém nas costas, um outro desenho escuro na pele branca parece saber que está ali para afirmar uma individualidade, na verdade pede aceitação em um grupo.

Os cabelos parecem um tanto descuidados, um descuido que definitivamente não é para amadoras. Não exibe cores artificialmente descaradas, apesar de suas variações de tons, geralmente claros, serem de difícil reprodução em condições exclusivamente naturais.

A blusa de alcinha provavelmente consta de alguma lista secreta de obrigações que possivelmente circula por baixo das mesas ou nas conversas em dupla no banheiro. Benditas blusas de alcinha que revelam ombros, colos, costas e sardas. Abençoadas blusinhas de alça, muitas vezes desacompanhadas de sutiãs, que permitem a observação de interessantes relevos e também do momento certo onde uma jaqueta pode ser oferecida para amenizar o frio.

As mãos dificilmente estão livres do cheiro/perfume de cigarro, nem sempre lícitos. Mãos geralmente frias, em constante companhia de copos gelados de formato variado, quase sempre preenchidos com cervejas multinacionais uniformemente pasteurizadas, mas que as donas dos copos insistem em perceber diferenças e declarar marca preferida.

Dentro da pseudo-humilde bolsa, também em couro, um celular fotográfico com toque MP3 dos Los Hermanos faz companhia à carteira marrom, guardiã dos Visas e Mastercards do pai e de uma identidade estudantil onde pode ser lido o nome de famosa universidade particular, conhecida pelos seus bons cursos de comunicação.

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Da Tecnologia da Informação


A era digital não é apenas uma época onde a informação é mais democrática e adolescentes incautas têm sua intimidades e celulites reveladas para todo o mundo em fotos que deveriam servir apenas o HD de seus namorados. Não, definitivamente a era digital não é apenas isso. Para mim, por exemplo, a era digital trouxe alguns novos prazeres quase que indescritíveis, afinal, se fossem realmente indescritíveis eu não estaria os descrevendo aqui.

Um destes prazeres remonta os primórdios da digitalização mundial em massa. Descobri o hobby por volta de 1996: a limpeza do mouse. Ah, sim, aquelas sujeirinhas acumuladas nos rolamentos internos deste decano objeto informático são um incrível passatempo para os enfadonhos momentos corporativos onde você procura uma distração à espera das 19h. O capricho na limpeza de cada detalhe, a sensação de dever cumprido ao testar o mouse novamente e perceber que sua movimentação melhorou após o serviço, tudo é motivo de gozo e satisfação. Infelizmente, o mouse-de-bolinha clássico perde cada vez mais espaço para os insossos e pasteurizados mouses óticos, que em primeira análise parecem representar um avanço tecnológico, mas na verdade são mais uma artimanha das grandes corporações para diminuir as opções distrativas de seus funcionários.

Ao contrário do mouse-de-bolinha, algo que insiste em existir é o clipe solícito do Word. Aquele ex-simpático personagem que algum programador da Microsoft achou que seria mais útil na resolução de dúvidas do que “o menino da informática”, uma entidade que desperta amor e ódio em iguais proporções, mas que resolve seus problemas mais rapidamente do que um clipe idiota que pensa ser animado. Ok, no início confesso que achei simpática a idéia do clipe gentil. Eu brincava com ele, clicava em cima do bicho com o botão direito e escolhia a opção “animar” só para ver do que ele era capaz. Como poucos sabiam dessa função, o domínio sobre a mesma me ajudou a encaixar conversa com uma estagiária. “Você já viu isso aqui?”, “nossa, que fofo, ele é animado, né?”, “quer fazer alguma coisa hoje? Happy hour?”, “humm...eu topo, mas preciso voltar cedo”. “Você viu minha cueca por aí?”, “Jesus! São sete da manhã, minha mãe vai me matar!”. Pensando bem, desculpe e obrigado por tudo, querido clipe extraordinário do Word.

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Links amigos


Hoje, mais uma vez, estou sem assunto ficcional, mas aproveito para deixar alguns links de blogs amigos (ou não) que andei visitando agora.

1 - Natalinha, além de continuar linda, escreve cada vez melhor. Este aqui tem mais graça se você for paraense e conhecer um pouco de história, mas também funciona para a geral.

2 - Paulo Nazareno de vez em quando colabora com o Ressaca Moral e de quando em vez resenha filmes da maneira mais original que tenho lido ultimamente.

3 - Karla Nazareth é um prodígio. Dificilmente um post seu não é no mínimo muito legal.

4 - Cardoso faz parte da velha guarda da web nacional. Visitar seu blog uma vez por semana faz bem pra pele.

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Conforto


As pessoas investem seu tempo e sua grana em hobbies variados. Alguns colecionam itens de tecnologia, outros montam boas adegas de vinho ou são fissurados em miniaturas de carros da primeira metade do século XX.

Eu acabei de voltar do almoço e descobri onde vou gastar meu dinheiro quando possuí-lo: sofás. Definitivamente eu amo sofás. Vou quebrar um dos quartos do meu apartamento para fazer uma sala imensa e assim poder ter mais sofás.

A vida pode acontecer em um sofá. Suas maiores emoções, suas histórias tristes. Vitórias, flatulências, refeições e adolescências. Ah, sofá.

Dois ou três lugares, com ou sem chaise longue. Modulado ou com puffe em ipsilone. Sofá pode ser branco, azul, vermelho, ocre. Sofá é tão bom que tem na Tok Stok.

Você possui um sofá para chamar de seu? Onde está o seu sofá cabe o meu? Você é um sofá? Na almofada fofa do meio é onde você está?

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You Tube Personal Hits


Por falta se assunto, deixo aqui links de You Tube para sua diversão. Alguns já são conhecidos, mas vale o repeteco.

Dahler Mehndi - http://www.youtube.com/watch?v=sTZUkEb161g
Você já deve ter visto Tunak Tunak Tun, o clipe mais famoso do indiano. Este outro é melhor produzido (repare que foi veiculado em alguma MTV da vida, certamente a da França, esse país esquisito onde qualquer porcaria faz sucesso). Eu sou fã do cara.

Fim do mundo em BH - http://www.youtube.com/watch?v=LgIPOV7R4mo
Palhaçada muito bem armada.

Monty Python e o Cálice Sagrado - http://www.youtube.com/watch?v=SRHp8vi9JsA
Lembra da cena do filme? Então assista a versão alternativa.

Apache - http://www.youtube.com/watch?v=eTKL8MNH95Q
O underground do movimento disco. Clássico do You Tube.

Kalluri Vaanil - http://www.youtube.com/watch?v=qRGC9U-M9pA
Outro clássico youtubista. O pop indiano é algo no mínimo sensacional, percebam a variação e a criatividade dos movimentos das coreografias.

Abba Super Trouper - http://www.youtube.com/watch?v=wyRJ7KbEEJM
Abba é do caralho. Impossível não verter uma lágrima.

Wander Wildner - http://www.youtube.com/watch?v=QfmUrw3E8j4
Essa música me lembra uma mulher em especial. Ela sabe disso.

Propaganda dos amigos - http://www.youtube.com/watch?v=wz5EBQKVZdw
Após quase 3 anos de trabalho, bebedeira e sacanagem, conseguimos. Boa sorte, irmãos.

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Roubo


Furtado do site do Arnaldo Branco. Saiu também no blog da Bizz.

Photobucket - Video and Image Hosting

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A banda - 3


A banda - 1
A banda - 2

Eu nos vocais, Mirtes na bateria e Beto na guitarra. Ainda precisamos de um baixista. Onde diabos arrumo um? Ninguém responde aos anúncios.

- Por que não tentamos o Orkut?

- Mirtes, arrumar um baixista pelo Orkut, como assim?

- É, pode ser uma boa.

- Mas Orkut é coisa de adolescente, só vai aparecer moleque metaleiro.

- Qual o problema com o metal? – Beto, o guitarrista que um dia sonhou ser o Steve Harris brasileiro, registra sua revolta.

- Nada Beto, só que o heavy metal não faz sentido para quem tem mais de 14 anos de idade, fora isso, quantas vezes eu tenho que dizer que estou montando essa banda pra pegar mulher?!

- Mas mulher gosta de metal – Insiste Beto.

- Claro, a Juliana Paes tem todos os discos do Slayer e a Cléo Pires sempre repete a mesmas depilações pubianas em formato de bode ou cruz invertida.

- Cara, como você é mesquinho. Eu não quero mais fazer parte disso, eu estou nessa pela música, tchau, adeus e may the beast be with you.

- Beto, espera! Não ligue pra esse idiota, ainda podemos ser uma grande banda, vamos ensaiar aquela sua música! – Mirtes tenta contemporizar.

- The God of Thunder Against The Hell Army?

- Bem, eu tinha pensado naquela do dragão, mas tudo bem, podemos ensaiar as duas ainda hoje, que tal?

Nosso guitarrista sossega o rabo e decide ficar graças à diplomacia de Mirtes. Sinto que ainda teremos muitos problemas no futuro.

Sem melhores alternativas, usamos o perfil de Mirtes no Orkut para anunciar uma vaga de baixista em comunidades direcionadas.

Mirtes: Olá pessoal, estou formando uma banda e procuro baixista. É papo profissional com músicas próprias e alguns covers, principalmente do Rappa. Interessados falem comigo.

- Porra, eu te disse que não vamos tocar Rappa!

- Esse é um momento decisivo meu caro, eu e Beto só ficamos na banda se tiver Rappa e algumas das composições dele.

- São épicos sobre deuses e dragões baseados na mitologia nórdica! – Beto protesta.

- Isso mesmo! Só topamos continuar se o repertório incluir Rappa e épicos sobre deuses e dragões baseados na metereologia fórmica ou algo assim!

- É mitologia nórdi...

- Estou no meio de uma negociação aqui! Você pode calar essa boca? – Mirtes interrompe a correção de nomenclatura que Beto pretendia fazer.

Tive de aceitar as condições impostas pelo motim, pois dificilmente outros músicos topariam formar uma banda com um vocalista que não sabe cantar. Ao menos negociamos para que minhas composições sejam a base do repertório, também terei poder de escolha do nome do grupo. Quando estivermos batendo nas praias do sucesso eu convenço os paspalhos a abandonarem essas idéias e seguirem exclusivamente meus planos.

Donita: Oi Mirtes, sou baixista e toco rock. Acabei de enviar algumas gravações minhas para o seu e-mail. Mostre pra galera da banda. Se você curtirem podemos marcar um ensaio.
Ah, e que engraçado seu apelido, achei que você fosse mulher, rsrsrs.

Mirtes: Olá Donita. Gostei das gravações, o pessoal da banda também. Respondi seu e-mail com as informações de dia, local e hora do ensaio. Se estiver ok pra você ligue para o número que está lá.
E MEU NOME NÃO É UM APELIDO, ok?


A idéia de uma baixista mulher me agradou, seria menos concorrência no pega-pega de groupies nos bastidores e ainda atrairíamos mais público para os shows, já que os marmanjos costumam gostar de banda com mulher no meio. Só falta ela ser gostosa, quem sabe até me dê uma chance.

- Olá, então é aqui o ensaio? – Donita chega ao meu apartamento, local de concentração de nossa banda ainda sem nome. É branca, olhos claros, porém castanhos, algumas sardas quase imperceptíveis adornam as maçãs do rosto, que por sua vez rodeiam harmoniosamente um nariz mais delicado que as bonecas de porcelana que minha mãe pinta. Os cabelos são longos e na cor sangue. A calça jeans surrada sugere um belo design de pernas e bunda, nada exagerado. A camisa branca do Motorhead possui estratégicos rasgos que deixam clara a ausência do sutiã.

- É aqui mesmo, você é a Donita? - Tento me controlar para continuar pensando com a cabeça que está acima do meu pescoço e não com a que está abaixo do meu umbigo.

Fazemos as apresentações de praxe, os dois outros patetas não conseguem esconder sua surpresa com a beleza da nova integrante. Provavelmente passarão a ocupar boa parte de seus pensamentos de banheiro com nossa baixista.

Antes do ensaio são trocados alguns diálogos a respeito de qual ônibus foi utilizado no deslocamento até o prédio, falamos sobre como andam quentes os últimos dias e tomamos os restos de uma Pepsi. Os instrumentos são retirados de seus cases, mais alguns comentários a respeito de marcas de guitarra e pratos de bateria. Logo eu já distribuía cópias com a letra de nossa primeira música, a que pretendo tornar nosso primeiro hit, “Pra Comer Você”, que Beto e Mirtes já estavam musicando havia alguns dias.

- Um, dois, três...

Mirtes dá as três batidinhas tradicionais com as baquetas e inicia nossa escalada ao sucesso. Beto solta o riff inicial e Donita senta a mão no baixo. Eu entro com a voz.

- Você não olhava pra mim / Por que diabos escutava o Nahim? / I’ve been the player of the original siiiiinnnnnn....

- Pára, pára, pára tudo nessa porra! – Donita mostra surpreendente impaciência – Que merda é essa, caralho!?

- Er...rock? – Respondo temeroso e quase me mijando.

- Cara, você canta mal pra cacete!

- Tão mal assim?

- Você não faz idéia.

- Então temos um problema?

- Um? Não seja otimista. Olha só pra essa banda: um baterista que tocava em bodas de prata e bailes de debutante, um guitarrista nerd que pelo jeito prefere jogar RPG... - Beto olha para o unicórnio alado que estampa sua camisa preta e murmura algo. – E o que é você como vocalista? Acha que vamos conseguir reunir ao menos dez pessoas para ver um show nosso??

Se ela não fosse mulher eu provavelmente a teria mandado à merda na terceira palavra, mas pensando bem, ela só não foi à merda porque é bonita.

- Olha, sabemos que faltam alguns ajustes e suas idéias serão bem-vindas, mas este tipo de crítica não está sendo produtiva neste momento. – Se eu não estivesse doido pra ver o bico do peito dela por baixo dessa blusa eu definitivamente a teria mandado à merda.

- Posso mesmo dar umas idéias? – Percebo um ar de perversidade nas palavras da baixista. Ela parecia ter feito aquele escândalo para conseguir espaço político na banda, afinal eu não canto tão mal assim. Certa vez consegui nota 80 em um videokê de padaria interpretando O Descobridor de Sete Mares.

- Claro que pode, estamos aqui pra isso: escutar as idéias de todos e chegar ao melhor produto final possível. – Beto e Mirtes se entreolham. Ainda penso no conteúdo abaixo daquela blusinha do Motorhead – Podemos continuar o ensaio? Temos que ganhar ritmo, depois você me dá uns toques vocais – Com duplo sentido, caso você queira entender assim, sua gata do caralho, penso comigo mesmo.

- Ok, então vamos lá...é um, dois, três! – Mirtes puxa o bloco novamente.

- Você não olhava pra mim / Por que diabos escutava o Nahim? / I’ve been the player of the original siiiiinnnnnn.... / Você! Não redigiu uma estrofe! / Você! Me deixou pela Orloff! / You! You don’t know nothiiiiinnnng....

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Reagge Brasil


O Reggae de Apartamento* é um gênero musical dos mais democráticos, pois abriga em suas fileiras desde profundas reflexões sobre o nascer do sol até as mais instigantes divagações a respeito do amor que você deixou, ô, ô, ô. São letras imediatas, rápidas, simples, mas carregadas de subjetividades óbvias difíceis de compreender em meros 5 minutos, mais ou menos o mesmo tempo que a música demorou a ser composta.

Vejam este exemplo real extraído de uma composição de uma banda de Belém do Pará (a segunda capital do Reggae no país, atrás apenas de São Luís):

Te entrego essa semente
sabendo que vai brotar
Flores de sentimento
reggado com água do mar

Pescador que prepara sua rede
Quer pescar...
Vento que sopra na praia
Quebra mar...


Viu como é simples? Mais fácil que isso só escrever besteira em blog.
Inspirados por Jah e muito a fim de conseguir fama e dinheiro com o reggae, eu e Rafael Guedes, um jornalista de meia pataca, formado na Renomada Escola Vladimir Cunha de Trambiques e Encrencas (RESVLACUTRAMEN), resolvemos colocar na tela algumas de nossas mais brilhantes composições cincominutivas.

Papel de Pão
(Rafael Guedes e Doda Vilhena)

Passa o tempo e não te vejo
Maresia faz a cabeça
Você é tudo o que desejo
Na raiz da planta cresça

A semente que inspira esta canção
Que eu rabisquei no papel de pão
Só pra te ver me declarar o teu amor
Na cor da pele da mais linda flor

Refrão (2x)
Ei, meu bem, bela flor do maracujá
Vem, vem que eu te quero Jah
Não, não me deixe só a esperar

Você é luz e história do meu céu
Não é possível viver sem o teu mel
Com sua luz eu me apago
E me ofusco, ô, ô, ô
Na beira dessa praia eu sou apenas um molusco, ô, ô, ô



*Rótulo criado pelo próprio Rafael Guedes, que já se intitula como o rei do gênero.

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Tampa da Panela


- Gosto de você.

- É tarde.

- Desculpa, não olhei a hora, são mais de meia noite?

- É tarde pra gostar de mim.

- Então às oito da manhã posso gostar?

- Até pode, mas não conte com a recíproca.

- Não a conheço, só de ouvir falar.

- Quem?

- A recíproca, porra.

- Eu dei oportunidade de você conhecê-la, quem gostava de alguém aqui era eu, lembra?

- Lembro...mas na época não dava, você sabe.

- Sei merda nenhuma.

- Minha cabeça é complicada, você nunca entendeu.

- Eu quero dormir, você poderia gostar de mim longe do telefone e sem me encher o saco com esse blá, blá, blá de “cabeça complicada”?

- Eu sempre te amei, só não tinha certeza.

- Frase interessante, até tirou um pouco do meu sono. Você ganhou mais algum tempo antes que eu desligue.

- É isso, ora bolas. Vamos ficar juntos?

- Perdeu tempo, ainda lhe restam 10 segundos.

- Er...porra! Eu apenas tive certeza, não é suficiente??

- 5 segundos.

- Tá, tá! Pára a contagem...eu confesso!

- Prossiga.

- É o meu carro. Ele parou no meio da rua aqui no seu bairro, esqueci o celular em casa, não tenho um puto no bolso e estou ligando de um posto de gasolina...sei que é pedir muito, mas você pode me ajudar?

- Onde fica o posto?

- Er...pera lá, vou ler as placas...Rua General Osório com Avenida 15 de Abril.

- O que aconteceu em 15 de abril?

- Sei lá.

- E General Osório, quem foi?

- Também não sei, Guerra do Paraguai?

- Eu também não faço a mínima idéia, desculpe.

- Alô? Alô?!

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As Filhas da Chiquita


As Filhas da Chiquita

Esse é o trailer do documentário da amiga Priscilla Brasil sobre a festa da Chiquita. Para quem não é de Belém, a tal festa é um rebuliço tradicional que acontece na Praça da República, centro da cidade, logo após a passagem da Trasladação, a romaria noturna do Círio de Nazaré. Veja e entenda um pouco.

Direção: Priscilla Brasil / Co-direção: Vladimir Cunha e Gustavo Godinho

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